quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Para que a juventude leia mais

Pesquisadora fala sobre o trabalho com a leitura nas escolas e a importância de o professor ser ele mesmo um leitor


A leitura é um mundo. Talvez seja ela o mundo. Dar à criança a chave que abre as portas desse universo é permitir que ela seja informada, autônoma e, principalmente, dona dos rumos de sua própria vida. Afinal, não é à toa que se fala tanto em uso social da leitura e da escrita. E para despertar nos pequenos o gosto pela literatura é fundamental que os professores sejam eles mesmos grandes entusiastas dos livros. É o que defende Regina Zilberman, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A pesquisadora será uma das palestrantes do Seminário Prazer em Ler de Promoção da Leitura - Nos Caminhos da Literatura, que se realizará a partir de amanhã em São Paulo. O evento é uma iniciativa do Instituto C&A e da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ). Leia a seguir uma entrevista exclusiva com Regina sobre a leitura na escola. E não deixe de acompanhar, aqui no site, nos dias 22, 23 e 24 de agosto, a cobertura on-line do evento.

O que já pode ser considerado como premissas para o docente no trabalho com a leitura?

Regina Zilberman: Parece óbvio o que vou dizer, mas a premissa é a de que o professor seja um leitor. Não apenas um indivíduo letrado, mas alguém que, com certa freqüência, lê produtos como jornais, revistas, bulas de remédio, histórias em quadrinho, romances ou poesias. O professor precisa se reconhecer como leitor e gostar de se entender nessa condição. Depois, seria interessante que ele transmitisse aos alunos esse gosto, verificando o que eles apreciam. Esse momento é meio difícil, pois, via de regra, crianças e jovens tendem a rejeitar a leitura porque ela é confundida com o livro escolar e a obrigação de aprender. Se o professor quebrar esse gelo, acredito que conseguirá andar em frente. A terceira etapa depende de a escola, por meio da biblioteca, da ação do professor e do interesse dos alunos, disponibilizar livros para todos. Mas as publicações não podem ser produzidas pelos alunos. Caso contrário, impede-se o reconhecimento do livro como um produto industrial, com características específicas e dentro do qual existe a matéria para leitura. O aluno precisa reconhecer que essa matéria é oriunda de um terceiro, o autor, com o qual o leitor dialoga.

Não existe fórmula para o trabalho com leitura em sala de aula, mas há uma série de pré-condições, como as que já citei e que considero mínimas. Precisamos, porém, reconhecer como fundamental também a valorização do trabalho do professor e o oferecimento de condições favoráveis de ensino, como segurança nas escolas públicas, livros na biblioteca, salas de aula equipadas, etc.. Essas são igualmente premissas, que não dependem do professor, mas de políticas públicas que tenham a Educação como foco principal.

O que já se sabe quando o assunto é leitura na escola?

Regina Zilberman: Há uma gama variada de pesquisas sobre o assunto, que começam com as questões de aquisição da escrita, estendem-se à psicolingüística e à sociolingüística e chegam à teoria da literatura, que desenvolveu uma ampla área de investigação relacionada aos processos de leitura e de formação do leitor. A escola, nesse caso, pode ser entendida tanto como o local onde se dá a aprendizagem da leitura e a preparação para o consumo de obras impressas, quanto como o espaço do desencantamento e da perda da magia trazida da infância, já que impede o contato direto com o mundo da oralidade, onde se fazia a transmissão original de histórias (contos de fadas, poemas, cantigas de ninar, etc.). A leitura na escola constitui um amplo campo de investigação porque, nas atuais condições de aprendizagem e ensino, é o lugar onde o indivíduo pode amadurecer intelectualmente ou retrair-se, evitando (ou minimizando) seus intercâmbios com o universo da cultura.

O que ainda precisa ser mais bem investigado nessa área?


Regina Zilberman: Eventos sobre leitura são bastante procurados por professores, pois eles se sentem bastante inseguros em relação à sua prática docente. Um congresso como o de leitura que se realiza na Universidade Estadual de Campinas, a cada dois anos, reúne cerca de cinco mil pessoas. Isso sinaliza igualmente o desejo de aprender por parte daqueles que ensinam. Além disso, há o interesse em socializar experiências bem sucedidas, razão porque é preciso estabelecer, em tais eventos, o momento de ouvir e o momento de falar. Nesses eventos se propicia o diálogo com o público e, sobretudo, a discussão sobre as alternativas que os professores encontram no trabalho com seus alunos.

No evento, o tema de sua apresentação será o Ensino Médio e a formação do leitor. Que tipo de leitores temos nesse nível de ensino?

Regina Zilberman: Os estudantes de classe média urbana chegam muito jovens ao nível médio. Mas lá também chegam alunos que têm apenas a noite para freqüentar a escola, já que trabalham durante o dia. Assim, há situações bastante distintas. No primeiro caso, não há grande diferença entre o aluno do oitavo ano do Ensino Fundamental e o do primeiro ano do Ensino Médio. Mesmo assim, há um amadurecimento nesse período que obriga o professor a lidar com uma situação híbrida, tendo de escolher livros que representem essa passagem (publicações recentes e que abordem temas associados a problemas do mundo contemporâneo). O professor provavelmente elegerá obras de maior estofo (ou as constantes de listas de vestibular) quando o aluno estiver no segundo ano do Ensino Médio. No segundo caso, a condição é outra: o aluno trabalhador é maduro, está preocupado com o serviço diário e não tem muitas oportunidades para ler e estudar. O espaço de leitura é o tempo da sala de aula e, nesse intervalo, o professor terá de ensaiar suas estratégias de ensino.

Qual a especificidade da leitura de textos informativos?

Regina Zilberman: Quem lê bem um conto ou um poema, lê bem uma notícia de jornal ou um manual de história ou de química. Se isso quer dizer que compete ao professor de língua e de literatura preparar bem o aluno para a leitura de qualquer tipo de texto, significa também que a aprendizagem da leitura envolve todo o corpo docente, e que um bom professor de História ou de Química ensinará os estudantes a ler adequadamente o material escrito onde está o conteúdo de sua matéria.

O que leva o professor a buscar um evento como este Seminário, que tratará de leitura?


Regina Zilberman: Acho que, no âmbito dos estudos literários, há ainda margem para estudar o impacto da leitura literária na formação do leitor, especialmente entre os jovens que freqüentam o Ensino Médio, território ainda não suficientemente mapeado nas pesquisas vigentes.

Revista Nova Escola
Elaborado por Meire Cavalcante

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Tecnologia e Formação Continuada

A formação continuada do professor e a utilização das tecnologias a serviço da educação



As tecnologias tomaram conta do mundo e todos sem exceção tiveram que se adaptar a essa nova ordem mundial.

De extrema necessidade é ocorrer essa mudança no sistema educacional, e colocar as tecnologias a serviço das escolas, mas com o cuidado de garantir o acesso e principalmente assegurar a aprendizagem significativa. Sendo assim, o professor deve estar apto para apropriar-se seguramente desses recursos.

Sabe-se que a tarefa de transformar nosso complexo sistema educacional exige múltiplas ações. E as mais importantes são as capazes de provocar impacto significativo na qualidade de formação da prática dos professores.

A utilização das tecnologias na educação não garantirá por si só a aprendizagem dos alunos, pois as mesmas são instrumentos de ensino que podem e devem estar a serviço do processo de construção e apropriação do conhecimento dos aprendizes. A introdução desses recursos na educação deve ser acompanhada de uma sólida formação dos professores para que eles possam utilizá-las de uma forma responsável e com potencialidades pedagógicas verdadeiras,
Diante disso, cabe ao professor buscar mecanismos necessários para sua formação que possibilitem prepará-lo para uso pedagógico das tecnologias. Mas, o desafio é gigantesco. As tecnologias podem oferecer novas perspectivas para a renovação do ensino. Contudo a rapidez com que elas se modernizam não acompanha a capacitação dos professores para utilizá-las corretamente na escola.

Sabemos que o ofício de professor é uma profissão complexa que exige constante adaptação às condições de trabalho bem como constante atualização científica, pedagógica e didática. Ainda que a formação inicial seja de elevada qualidade, a formação contínua é, ainda, uma necessidade para garantir qualidade de ensino.

E o grande desafio é mudamos os paradigmas convencionais do ensino com as novas mídias. É dessa maneira, então, que se deve considerar a formação inicial e assegurar a formação continuada. Completando essa idéia, Rezende e Fusari (2001, p.242) sugere que haja uma articulação entre a formação inicial e a formação de professores, tendo como eixo central a prática docente, afirmando "que a formação inicial de professores precisa estar 'de olho' no que está acontecendo no exercício da docência, mas o docente em exercício tem que estar 'de olho' nos cursos de formação inicial de professores". Portanto é de suma importância que o educador esteja sempre participando de cursos de formação continuada, buscando assim, aprimorar sua prática pedagógica.

Dessa maneira, a formação inicial seguida da formação continuada deverá ser capaz de dar ao educador condições de desenvolver constantemente suas habilidades e aptidões a fim de integrar as tecnologias a sua prática docente e ser competente de, no momento certo e sob as condições adequadas, definir qual a tecnologia deve ser acionado à prática docente, levando-os a uma formação que conjugue conhecimento e reflexão sobre a prática. Como aponta Gómez (1995, p. 112), "o conhecimento-na-ação só é pertinente se for flexível e se apoiar na reflexão na e sobre a ação".

No entanto, O professor não precisa voltar à universidade para buscar conhecimentos voltados a utilização das tecnologias em sua prática pedagógica, quais suas reais possibilidades defavorecer uma aprendizagem significativa no processode construção de conhecimento. No seu próprio local de trabalho os professores podem adquirir por meio de formação continuada, a oportunidade refletir sobre a importância de utilizar pedagogicamente as tecnologias e analisar sua aplicabilidade no processo ensino e aprendizagem.

Portanto, é imprescindível a participação dos professores em cursos de formação contínua e eficiente, gerando consequentemente transformações em sua prática pedagógica e assumindo uma postura crítica e reflexiva quanto ao uso e por queutilizar ou não as tecnologias no processo de construção de novos conhecimentos.


Sandra Maria Oliveira dos Santos

Especialista em Tecnologias em Educação pela PUC/RIO (2007); Graduada em Licenciatura Plena em Letras pela UNIFAP (2007). Professora Multiplicadora das TIC’s do Núcleo de Tecnologia Educacional NTE Marco Zero. Tutora dos cursos de Pós-Graduação em Gestão Escolar e Mídias na Educação III da Universidade Federal do Amapá.

sábado, 13 de novembro de 2010

Pelo bem das próximas gerações, por Lídia Aratangy

Estabelecer limites para os adolescentes de hoje é uma das garantias de que o país terá líderes éticos no futuro. A tarefa cabe a pais e escolas - em conjunto



Cenas de violência não se passam apenas nos cenários pobres de escolas públicas: acontecem também em escolas de classe média, freqüentadas por jovens de famílias econômica e culturalmente privilegiadas. Aí o problema pode ser até mais difícil, pois os professores dessas escolas têm a expectativa de que seus alunos tragam de casa uma educação adequada - e sentem-se despreparados para lidar com alunos agressivos e sem limites. Mas não adianta lavar as mãos nem clamar aos céus, com a alegação de que a escola não pode tomar a si a responsabilidade que a família não assume. Ainda é dentro de seus muros que esses jovens passam a maior parte do tempo, e essa oportunidade não pode ser desperdiçada. 

É na adolescência que se desenvolve plenamente a capacidade de raciocínio abstrato, e é esse o melhor momento para firmar o compromisso com valores morais como a tolerância pelo diferente, o amor à justiça, o sentimento de solidariedade e a compaixão. É verdade que a escola não pode se encarregar de todos os aspectos da formação de seus alunos, mas é indesculpável que não faça tudo o que estiver ao seu alcance. As situações de violência não devem passar impunes, as agressões não podem ser ignoradas. Mas o castigo é parte do processo educativo, e não uma vingança ou penitência: deve ser contingente (isto é, aplicado logo depois da falta cometida), ligado à transgressão e, de preferência, oferecer a possibilidade de reparação do erro. Se a violência teve a forma de depredação de bens da escola, por exemplo, o aluno deveria ser levado a consertar o que quebrou; se foi agressivo com colegas ou professor, deveria ser orientado a fazer um trabalho sobre violência. É preciso lembrar que, quando um aluno tem um comportamento agressivo, a violência que ele expressa não está só nele: ele é protagonista de todo o seu grupo. Sua expulsão não elimina a violência da escola, apenas a exime de lidar com a questão. A escola deveria aproveitar o episódio de violência para levar todo o grupo a refletir sobre a ética da convivência. Há excelentes filmes (veja indicações abaixo) que podem ser usados para mobilizar nos jovens os sentimentos de empatia e solidariedade. O ideal seria que os alunos assistissem a esses filmes na própria escola, junto com educadores (professores ligados ao tema e orientadores) e, se possível, também os pais. Antes da projeção, deve ser feita uma breve contextualização do tema do filme e, logo após, um debate ligando a ficção com a realidade.

Nessa área, é imprescindível uma parceria verdadeira entre escola e família. Infelizmente, na maioria das vezes, essa aliança é superficial, carregada de hipocrisia. Diante de uma crise importante, dificilmente os pais do aluno problemático e os gestores da escola podem de fato dar-se as mãos em prol do jovem: a tendência da escola é expulsar o aluno, com a alegação (em geral verdadeira) de que os pais dos outros alunos não tolerariam deixar seus filhos numa escola que eles consideram conivente com o aluno faltoso. Mais produtivo seria que a escola e os pais trocassem informações a respeito do comportamento do aluno. Para a escola, será útil conhecer as normas da família sobre disciplina, saber a atitude dos pais com relação a punições e ao uso da autoridade, saber como o aluno se relaciona com os irmãos e que tipo de lazer os pais oferecem. A escola, por sua vez, conhece, melhor do que os pais, o comportamento social do jovem. Essa troca de informações permite uma programação conjunta de atividades (leituras, discussões, escolha mais cuidadosa de videogames etc) dentro e fora da escola, que poderão ajudar o aluno a rever e mudar sua atitude inadequada.

É importante lembrar que, se esses jovens correm alguns dos mesmos riscos que os economicamente menos privilegiados, em suas mãos a sociedade talvez corra riscos até maiores: estatisticamente, é dentre esses alunos que sairão os políticos e empresários da próxima geração, é desse grupo que sairá a maior parte das autoridades e líderes que comandarão o país. Essa é a hora de encontrar canais adequados para o inconformismo e a rebeldia, esse é o momento de apontar espaços de atuação onde a contestação própria da adolescência contribua, de fato, para melhorar o mundo. Para dar vazão à inquietação adolescente, é preciso levá-lo a desempenhar atividades significativas, como participação em programas solidários, que rompam a barreira do individualismo e façam com que ele se sinta parte de uma comunidade maior.

Não podemos deixar que eles acreditem que o mundo é feito de corrupção e violência, e que nele só os valentões e os espertalhões levam vantagens. Para lutar contra a paralisia e o cinismo de que tanto nos queixamos, não há momento mais propício do que a adolescência, não há espaço mais adequado do que a escola.

FILMES

Abaixo, as indicações de Lidia Aratangy para exibições na escola.

Jamaica Abaixo de Zero Direção: Jon Turteltaub
Aparentemente, um filme sobre o espírito esportivo. Mas é também uma obra-prima sobre a solidariedade, o espírito de equipe e o respeito a si mesmo e ao outro. Fundamental.

O Clube da Felicidade e da Sorte Direção: Wayne Wang
A história de quatro imigrantes chinesas nos Estados Unidos serve de pano de fundo para lidar com o choque de gerações e o preconceito.

O Banquete de Casamento Direção: Ang Lee
O filme aborda a questão da homossexualidade masculina de maneira leve, levando o espectador a se identificar com os personagens, abalando assim os estereótipos sobre o amor e a sexualidade.

O Sol É para Todos Dieração: Robert Mulligan
Um dos mais pungentes libelos contra o preconceito que o cinema já produziu.

Glória Feita de Sangue Direção: Stanley Kubrick
Um filme sobre a irracionalide humana, que mostra o desvario das guerras e do conceito de heroísmo.

Este Mundo É dos Loucos Direção: Philippe de Broca
A metáfora dos loucos que tomam conta da cidade abandonada provoca o questionamento sobre a inversão dos conceitos de sanidade e doença em nossa cultura.


O Inventor de Ilusões Direção: Steven Sodesbourgh
Relata a saga de um garoto cuja mãe sofre reiteradas internações para tratamento de saúde. O menino vive com o pai em um quarto de hotel, em St. Louis, e passa por vicissitudes para lidar com a solidão, o desamparo e a fome.

Grand Cannyon Direção: Lawrence Kasdan
Choque de gerações e de valores, num filme denso e emocionante.

Sociedade dos Poetas Mortos Direção: Peter Weir
O professor apaixonado e criativo leva seus alunos (e a plateia) a indagações sobre o significado do conhecimento e a importância da cultura.


O Feitiço do Tempo Direção: Harold Banis
A história aparentemente despretenciosa do repórter ranzinza e egoísta que se transforma com a repetição reiterada de um único dia de sua vida evoca temas fundamentais como a solidariedade e o preconceito.

Edward Mãos de Tesoura Direção: Tim Burton
Recorrendo ao mito do rapaz que possuia duas tesouras no lugar das mãos, o filme trata com sensibilidade de questões como o desajeitamento do adolescente e o preconceito.


Todos os Corações do Mundo Direção: Murilo Sales
O futebol serve de veículo para retratar diferentes expressões da emoção e momentos de solidariedade e confraternização.


Revista Nova Escola
Lídia Aratangy


sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Avaliar com eficácia e eficiência

Texto 11

Vasco Pedro Moretto

Avaliar a aprendizagem tem sido um tema angustiante para professores e estressante para alunos. Nas conversas com professores, orientadores e diretores, o assunto avaliação é sempre lembrado com um suspiro de desânimo e uma frase eloqüente: "Esse é o problema aí está o nó!".

Muito se tem escrito e falado sobre a avaliação da aprendizagem. As dúvidas continuam, os pontos de vista se multiplicam e as experiências se diversificam. O sistema escolar gira em torno desse processo e tanto professores como alunos se organizam em função dele. Por isso a verdade apresentada é: professores e pesquisadores precisamos estudar mais, debater com profundidade e conceituar com segurança o papel da avaliação no processo da aprendizagem.

A avaliação da aprendizagem para alguns professores é aterrorizante pois não sabem como transformá-la num processo que não seja uma cobrança qualquer de conteúdos decorados, ou como no velho ditado, "aprendido de cor",  de uma forma mecânica e sem muito sentido para o aprendiz.

Para alguns pais a prova não exerce seu real papel, se a nota for razoável ou ótima, eles (os pais) ficam satisfeitos com o resultado, pois pressupõem que a nota transmite que a aprendizagem esta sendo correspondente, o que nem sempre é a verdade. E os aprendizes sabem disso, se a nota for ótima exibem para os pais e acabam ganhando "regalias" como aumento da mesa e passeios extras, além de ficar bem "visto" aos olhos dos pais taxado como um aluno exemplar.

A avaliação é parte integrante do ensino e da aprendizagem. O ensinar, um dia, já foi concebido como o transmitir conhecimentos prontos e acabados, conjunto de verdades a serem recebidas pelo aluno, gravadas e devolvidas na hora da prova. Nessa visão de ensino, o aprender tem sido visto como gravar informações transcritas para um caderno (cultura cadernal) para devolvê-las da forma mais fiel possível ao professor na hora da prova.

O processo de ensino nos dias de hoje é visto como tradicional, a avaliação de aprendizagem é encarada como um processo de "toma-lá-dá-cá", em que o aluno deve devolver ao professor o que dele recebeu e de preferência exatamente como recebeu, o que Paulo Freire chamou "educação bancária". Nesse caso não cabe criatividade, nem interpretação. A relação professor-aluno vista dessa forma é identificada como uma forma de dominação, de autoritarismo do professor e de submissão do aluno; sendo por isso uma relação perniciosa na formação para a cidadania.  

A perspectiva construtivista sociointeracionista propõe uma nova relação entre o professor, o aluno e o conhecimento. Ela parte do princípio que o aluno não é um simples acumulador de informações, ou seja, um mero receptor-­repetidor. Ele é o construtor do próprio conhecimento.

 A construção do conhecimento é um processo interior do sujeito da aprendizagem, estimulado por condições exteriores criadas pelo professor. Por isso dizemos que cabe a este o papel de catalisador do processo da aprendizagem.

Catalisar/mediar/facilitar são palavras que indicam o novo papel do docente no processo de interação com o aluno.

 
Prova: um momento privilegiado de estudo

A avaliação pode ser  feita de formas diversas, com instrumentos variados, sendo o mais comum deles, em nossa cultura, a prova escrita. Por esse motivo, em lugar de apregoarmos os malefícios da prova e levantarmos a bandeira de uma avaliação sem provas, procuramos seguir o princípio: se tiver que elaborar provas, que sejam bem feitas, atingindo seu real objetivo, que é verificar se houve aprendizagem significativa de conteúdos relevantes.

É  preciso ressaltar, no entanto, que a avaliação da aprendizagem precisa ser coerente com a forma de ensinar. Se a abordagem no ensino foi dentro dos princípios da construção do conhecimento, a avaliação da aprendizagem seguirá a mesma orientação. Nessa linha de pensamento, propomos alguns princípios que sustentam nossa concepção de avaliação da aprendizagem:

  •  A aprendizagem é um processo interior ao aluno, ao qual temos acesso por meio de indicadores externos.
  •  Os indicadores (palavras, gestos, figuras, textos) são interpretados pelo professor e nem sempre a interpretação corresponde fielmente ao que o aluno pensa.
  •  O conhecimento é um conjunto de relações estabelecidas entre os componentes de um universo simbólico.
  •  O conhecimento construído significativamente é estável e estruturado.
  •  O conhecimento adquirido mecanicamente é instável e isolado.
  •  A avaliação da aprendizagem é um momento privilegiado de estudo e não um acerto de contas.

Revoltado ou Criativo

Waldemar Setzer

A um tempo atrás recebi o convite de um colega para ser árbitro de revisão de uma prova de física, pois o aluno contestava tal conceito, alegando que merecia nota máxima pela resposta, a não ser que houvesse uma "conspiração do sistema" contra ele. Professor e aluno concordaram em submeter o problema a um juiz imparcial, e eu fui o escolhido.

Chegando à sala de meu colega, li a questão da prova que dizia: "Mostre como se pode determinar a altura de um edifício bem alto com o auxílio de um barômetro".

A resposta do estudante foi a seguinte: "Leve o barômetro ao alto do edifício e amarre uma corda nele; baixe o barômetro até a calçada e em seguida levante-o, medindo o comprimento da corda; este comprimento será a altura do edifício."

A resposta dada pelo aluno estava correta, escrita de uma forma diferente da que o professor desejava mais estava certa. Entrando em acordos com ambas as partes, propus ao aluno reformular a pergunta em seis minutos. Ele ficou lá pensando olhando para o teto, e eu apressado pois havia outro compromisso logo em seguida e nada do aluno escrever. Passados cinco minutos e nada escrito. O aluno não havia desistido, na realidade ele tinha muitas respostas, e estava justamente escolhendo a melhor. Desculpei-me pela interrupção e solicitei que continuasse. No momento seguinte, ele escreveu essa resposta: "Vá ao alto do edifício, incline-se numa ponta do telhado e solte o barômetro, medindo o tempo (t) de queda desde a largada até o toque com o solo. Depois, empregando a fórmula h = (1/2)gt2, calcule a altura do edifício." 

Um pouco inconformado o professor concordou em aceitar a resposta do aluno, afinal estava correta. Pode-se dar inúmeras respostas para uma dada pergunta e mesmo esta resposta sendo diferente daquela que o professor imaginava receber não se pode dar como "errado" algo que esta certo.

 
 A esta altura, perguntei ao estudante se ele não sabia qual era a resposta "esperada" para o problema. Ele admitiu que sabia, mas estava tão farto com as tentativas dos professores de controlar o seu raciocínio e cobrar respostas prontas com base em informações mecanicamente arroladas, que ele resolveu contestar aquilo que considerava, principalmente, uma farsa.

Este texto nos remete a reflexão de como seé feito o processo de avaliação.  Em primeiro lugar chamamos a atenção sobre a forma de elaborar uma pergunta. Se a pergunta não for clara e precisa, ela permite muitas respostas, todas "corretas", embora diferentes das "esperadas" por quem perguntou. Em segundo lugar é certo que o contexto dá o sentido ao texto, assim alguém poderia argumentar que uma resposta numa prova deve ser dada em função do contexto do ensino, isto é de acordo com o que o professor apresentou em aula. 

A finalidade tanto do ensino como da avaliação da aprendizagem é criar condições para o desenvolvimento de competências do aluno, quanto mais completa for a formulação das questões, tanto melhor será a formação do aluno para sua vida profissional.

Para se entender melhor o processo de avaliação, ao longo de uma década mais de seis mil provas foram aplicadas em escolas de quase todos os estados do Brasil. Os resultados foram divididos em dois blocos, o primeiro voltado para o que chamamos de "características das provas tradicionais" e o segundo para "características das provas na perspectiva construtivista".

Eficácia e eficiência na avaliação da aprendizagem


A avaliação é eficaz quando o objetivo proposto pelo professor foi alcançado.

A eficiência está relacionada ao objetivo e ao processo desenvolvido para alcançá-lo. Para que a avaliação seja eficiente, é preciso que seja também eficaz. Da mesma forma, a avaliação pode ser eficaz sem ser eficiente. O professor tem que organizar de forma eficiente o processo da avaliação da aprendizagem.


Algumas características das provas na linha tradicional

a) Exploração exagerada da memorização

A memorização certamente tem seu lugar no processo da aprendizagem, desde que seja uma memorização acompanhada da compreensão do significado do objeto de conhecimento. O que a escola da linha dita tradicional explorou com mais ênfase foi a memorização em busca do acúmulo de informações, em grande parte sem muito significado para os alunos.

b) Falta de parâmetros para correção

Esta é uma característica encontrada em muitas provas e que deixa o aluno "nas mãos do professor". Com a falta de definição de critérios para a correção, vale o que o professor queria que o aluno tivesse respondido. Por isso, muitos alunos, em momentos de avaliação levantam a mão e perguntam: "Professor, o que o senhor quer mesmo nessa questão 5?". Note que o aluno não pergunta: "O que diz a questão 5?", mas quer saber o que o professor deseja. Ele sabe que, numa cultura de toma­lá-dá-cá, deve responder o que o professor quer, mesmo que na questão não esteja claro.

c) Utilização de palavras de comando sem precisão de sentido no contexto

 Toda pergunta busca uma resposta. A clareza e precisão da segunda dependerá muito da estrutura da primeira. Há palavras de comando usadas com muita frequência na elaboração de questões de prova e que não têm sentido preciso no contexto. Destaquemos algumas delas: comente, discorra, como, dê sua opinião, conceitue você, como você justifica, o que você sabe sobre, quais, caracterize, identifique as principais características. Não estamos afirmando que as palavras não podem ser utilizadas. O que dissemos é que elas precisam ter sentido no contexto em que são usadas permitindo a parametrização correta da questão.


1  Estabeleça, em redação sucinta, a diferença entre empresa e sociedade.

2  Na visão de Maquiavel, quais as principais formas de governo? Especifique a finalidade de cada uma.

3  Os Livros Sagrados são suscetíveis de interpretação? Comente.

4  Comente: "O ordenamento jurídico é um conjunto harmônico de regras que não impõe, por si, qualquer divisão, em seu campo normativo".

5  Discorra sobre a importância da data nas formas ordinárias de testamento.

Características das provas na perspectiva construtivista

Chamamos "provas na perspectiva construtivista" aquelas que são elaboradas segundo os princípios da perspectiva epistemológica apresentada nas páginas anteriores. As características foram estabelecidas por nós, num critério muito pessoal, em função de sua incidência nas provas analisadas e nos princípios do construtivismo sociointeracionista que serviram de parâmetros para a análise.

a) Contextualização

O texto deve servir de contexto e não de pretexto.


Quando falamos que uma questão deveria ser contextualizada, significa que, para responder a mesma, o aluno deveria buscar apoio no enunciado. Elaborar um contexto não é apenas inventar uma história, ou mesmo colocar um bom texto ligado ao assunto tratado na questão. É preciso que o aluno tenha que buscar dados no texto e a partir disso responder à questão.

b) Parametrização

A parametrização é a indicação clara e precisa dos critérios de correção. Nas páginas anteriores chamamos sua atenção várias vezes sobre esse ponto que é, a nosso ver, um dos fundamentais para uma relação profissional entre o professor e aluno, no processo da avaliação da aprendizagem.

c) Exploração da capacidade de leitura e de escrita do aluno

Ouvimos frequentemente dizer que nossos alunos não sabem ler nem escrever. No momento privilegiado de estudo – a prova –nem sempre lhes damos a oportunidade de fazê­-lo. Por isso indicamos como característica das provas na perspectiva construtivista a colocação de textos que obriguem a leitura, mesmo curta, para provocar uma resposta, também de forma escrita e com argumentação, que leve o aluno a escrever, exercitando-se na lógica e na correção do texto.

d) Proposição de questões operatórias e não apenas transcritórias

Questões operatórias são as que exigem do aluno operações mentais mais ou menos complexas ao responder, estabelecendo relações significativas num universo simbólico de informações. Já as questões transcritórias são aquelas cuja resposta depende de uma simples transcrição de informações, muitas vezes aprendidas de cor (quando não transcritas de uma "colinha") e normalmente sem muito significado para o aluno em seu contexto do dia-a-dia.


Crítica

Particularmente achei este texto ótimo, abordou a questão do processo de avaliação de uma forma muito suscinta, sem rodeios deixando o leitor bem informado do assunto.

Já não é de hoje que este assunto "AVALIAÇÃO" é polêmico e por certas vezes causa pânico no aluno, pois cada docente possui uma forma diferenciada de ministrar sua aula e de aplicar a avaliação.

A avaliação escolar avaliação é a reflexão transformada em ação, que impulsiona a novas reflexões. Cabe ao educador uma reflexão permanente sobre a sua realidade, um acompanhamento contínuo do educando, na trajetória da construção do conhecimento.

Lendo outras fontes sobre este assunto, encontrei algumas definições a cerca da avaliação e achei interessante, por este motivo irei colocar algumas no contexto desta crítica.

  • Luckesi (1996), "é como um julgamento de valor sobre manifestações relevantes da realidade, tendo em vista  uma tomada de decisão".
  • Souza (1992 ) , "a avaliação exerce um poderoso controle sobre o conhecimento, porque o aluno ' estuda ' para fazer prova, responde corretamente aquilo que nem mesmo compreendeu, sem esquecer que as questões são mal formuladas e permitem várias interpretações".
  • Moretto (1996, p. 1) "a avaliação tem sido um processo angustiante para muitos professores que utilizam esse instrumento como recurso de repressão e alunos que identificam a avaliação como o "momento de acertos de contas", "a hora da verdade", "a hora da tortura".
  • Gadotti ( 1984 ), diz que "educar é fazer ato de sujeito, é problematizar o mundo em que vivemos para superar as contradições, comprometendo-se com esse mundo para recriá-lo constantemente".
A  avaliação tem como dimensão o desempenho do aluno, e o professor é o mediador, pois é ele que terá o papel de avaliar o aluno de acordo com suas demonstrações de aprendizagem ou não no assunto tratado em aula, mais muitas vezes os alunos levam as aulas com "a barriga" e não estudam, quando o docente fala "vamos ter prova dia..." aí todos ficam desesperados querendo dar conta da matéria dada até o momento. Isso é uma coisa totalmente errada, claro já passei por esta fase de "não estou nem aí para o estudo" ou até mesmo "ai estudar é um saco", mais isso tudo é para o futuro do jovem e somente ele é capaz de mudar tão pensamento.

Tudo muda, tudo se transforma e algumas coisas mudam para melhor e outras nem tanto, no caso sas avaliações também ocorre desta maneira, de acordo com o tipo de professor a avaliação será passada de uma forma diferente, por exemplo, tem professores que não aplicam provas e simplesmente observam o desempenho do aluno em classe e sua participação em sala, outros já aplicam inúmeras provas achando que essa é a melhor maneira de saber se o seu método de ensino esta fluindo. Nossa, até hoje existem professores tradicionalistas ao extremo, onde são tão "fechados" para as mudanças, outros são "tapados" no quesito "não posso ser contrariado", essas coisas pequenas muitas vezes acabam bloqueando o aluno com aquele professor e aí mesmo que o aluno irá se dar mal na disciplina, coisas forçadas aos alunos não fluem legal e eles acabam pegando "medo" do mesmo.

O professor deve ver seu aluno como um ser social e político, construtor do seu próprio conhecimento. Deve percebê-lo como alguém capaz de estabelecer uma relação cognitiva e afetiva com o seu meio, mantendo uma ação interativa capaz de uma transformação libertadora e propiciando uma vivência harmoniosa com a realidade pessoal e social que o envolve.

Talvez algum dia tudo mude mais até lá ainda teremos esses lemas e dilemas no processo de avaliação mais até esse dia chegar todos devem ficar atentos, pois não é só os professores que devem puxar seus alunos para o estudo, os pais exercem uma função primordial nesta questão, é de casa que se tem o incentivo e a determinação para nunca desistir quando nos deparamos com alguma dificuldade aparente.

A avaliação tem um significado muito profundo, à medida que oportuniza a todos os envolvidos no processo educativo momentos de reflexão sobre a própria prática. Através dela, direciona o trabalho, privilegiando o aluno como um todo, como um ser social com suas necessidades próprias e também possuidor de experiências que devem ser valorizadas na escola. Devem ser oportunizados aos alunos os conhecimentos historicamente acumulados pela humanidade.

Para deixar claro...

Avaliãção educacional =>  é uma tarefa didáctica necessária e permanente no trabalho do professor, ela deve acompanhar todos os passos do processo de ensino e aprendizagem. É através dela que vão sendo comparados os resultados obtidos no decorrer do trabalho conjunto do professor e dos alunos, conforme os objectivos propostos, a fim de verificar progressos, dificuldades e orientar o trabalho para as correcções necessárias.


A avaliação é um elemento muito importante no Processo de Ensino e Aprendizagem, porque é através dela que se consegue fazer uma análise dos conteúdos tratados num dado capítulo ou unidade temática. A avaliação reflecte sobre o nível do trabalho do professor como do aluno, por isso a sua realização não deve apenas culminar com atribuição de notas aos alunos, mas sim deve ser utilizada como um instrumento de colecta de dados sobre o aproveitamento dos alunos. Esta, porém, determina o grau da assimilação dos conceitos e das técnicas/normas; ajudam o professor a melhorar a sua metodologia de trabalho, também ajuda os alunos a desenvolverem a auto confiança na aprendizagem do aluno; determina o grau de assimilação dos conceitos.


quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Como incentivar o hábito de leitura entre os adultos

Gente grande tem mil desculpas para deixar a leitura de lado. Facilitar o acesso aos livros é fundamental para conquistar esse público


Conduzir uma criança ao prazeroso universo da leitura nem sempre é uma tarefa simples. Mas também não é tão difícil assim. Afinal, tempo livre e imaginação solta - características de toda infância saudável - são tremendos facilitadores. Bem mais complicado é transformar em leitor um adulto que chegou a essa fase da vida sem ter descoberto o prazer dos livros. Missão espinhosa? Sem dúvida. Mas não é impossível.

Mais do que a possibilidade de se desligar do mundo real e embarcar no enredo de uma bela obra literária, é necessário dar ao adulto a dimensão de que ler é uma experiência de múltiplas faces: ela pode mudar a vida dele e ajudá-lo em conquistas palpáveis, seja o ingresso numa boa universidade ou um simples bate-papo, mais animado e inteligente, na mesa de um bar. Também é preciso facilitar ao máximo o acesso dele ao livro, pois a vida adulta geralmente pressupõe trabalho, falta de tempo, cansaço e pouca disposição para qualquer assunto que não seja "urgente".

O segredo é transformar esses supostos impedimentos em motivos para colocar a leitura na pauta do dia a dia. Ler pode ser, por exemplo, o jeito mais divertido de encurtar o trajeto entre a casa e o trabalho, ou de enfrentar uma longa fila no banco. E, quanto mais próximos os livros estiverem, melhor. Tanto faz se a biblioteca fica numa casa da vizinhança, no caminho para o serviço ou no próprio ambiente de trabalho.

No balanço das horas

Para os usuários do metrô em São Paulo, Rio de Janeiro e Recife, a correria do dia a dia deixou de ser desculpa. Desde 2004, o projeto Embarque na Leitura, iniciativa do Instituto Brasil Leitor (IBL), instala bibliotecas em algumas estações. "Para transformar em leitor assíduo um adulto que não lê regularmente e vive estressado com o corre-corre de uma cidade grande, o jeito é colocar o livro em seu caminho. As pessoas precisam tropeçar nele. Caso contrário, se distraem e fazem qualquer outra coisa", diz William Nacked, idealizador do projeto e diretor geral do IBL.

A quantidade de leitores que se associaram na primeira unidade inaugurada em São Paulo, a da estação Paraíso, superou as expectativas mais otimistas. Hoje, as quatro bibliotecas paulistanas do projeto somam 33 mil sócios, que já fizeram 248 mil empréstimos. A recepcionista Maria das Graças Santos, 32 anos, fez sua carteirinha logo depois da inauguração da unidade Paraíso. E, embora a estação não estivesse em seu trajeto rotineiro, ela fazia algumas baldeações a mais só para passar na biblioteca após o trabalho. Com a inauguração da unidade Tatuapé, Maria das Graças já não precisa desviar de seu caminho. E ler ficou ainda mais fácil. "Entre o ir e o vir do trabalho, tenho três horas inteiramente dedicadas à leitura. Consigo dar conta de um livro por semana", diz a recepcionista, que agora se diz fã do escritor Machado de Assis. E ela acrescenta que, de uns tempos para cá, vem percebendo que o número de leitores nos trens do metrô paulistano tem aumentado.

Embora 64% dos usuários dessas bibliotecas sejam mulheres, os coordenadores do projeto registraram em 2007 um aumento de 38% no número de associados do sexo masculino. O motivo? Uma isca bem jogada. Aproveitando-se da realização dos Jogos Panamericanos na cidade do Rio de Janeiro, as vitrines foram preenchidas com títulos sobre esporte. Resultado: atraídos pelo tema, os homens deixaram-se fisgar pelo prazer da leitura.

William Nacked calcula que os sócios lêem, em média, dois livros por mês. "Há três mitos que esse projeto derrubou: o de que o brasileiro não gosta de ler, o de que ele não devolve o livro que pega emprestado e o de que ele só escolhe porcaria." O Embarque na Leitura mantém bibliotecas nas estações Paraíso, Tatuapé, Luz e Largo Treze, em São Paulo; na Central, do Rio de Janeiro; e na estação Recife, da capital pernambucana.

Caixinha de surpresas

Nas cidades-satélite de Brasília, o projeto de incentivo à leitura Mala do Livro já atendeu, em 18 anos, mais de 1 milhão de pessoas. A ideia, de uma simplicidade admirável, foi da bibliotecária Neusa Dourado: levar pequenas coleções de livros em cestas de palha para comunidades que ficam longe demais de uma biblioteca pública. Deu tão certo que, em 1995, o programa foi incorporado pela Secretaria Estadual de Educação. Os frágeis cestos, então, foram substituídos por caixas-estantes de madeira, com espaço para 180 livros cada uma. Hoje, elas estão distribuídas por 502 residências no entorno de Brasília. Há outras também em centros comunitários, abrigos, museus e até hospitais. E é a vizinhança que dita o "perfil" dos livros de cada mala. Maria José Lira Vieira, professora de Psicologia e coordenadora do projeto, diz que cada localidade tem uma demanda específica. Algumas preferem literatura de cordel. Outras, livros de receitas e até sobre cuidados médicos.

Helena Conceição Silva tem 82 anos e há mais de quatro abriga uma mala em casa, na região administrativa de Samambaia. Além de receber visitas (que entram e saem o dia todo, levando e trazendo livros), dar orientações e anotar os pedidos, ela também encontra tempo para ler. “Com a mala aqui em casa eu sempre vejo as novidades primeiro. Dá para ler até uns dez livros por mês.” O acervo também se faz presente em hospitais, como o Santa Lúcia, em Brasília. A ideia é dar aos trabalhadores do local a chance de aproveitar momentos de folga - o intervalo do almoço, por exemplo - para desenvolver o hábito da leitura. Uma das maiores fãs da minibiblioteca é a escriturária Guaciane Nunes de Oliveira, 25 anos. De tanto fazer retiradas semanais, ela incentivou algumas amigas, que hoje vão sozinhas escolher seus próprios livros.

Da escola para o trabalho

Em Imigrante, uma cidadezinha com pouco mais de 3 mil habitantes a 136 quilômetros de Porto Alegre, são os vereadores-mirins do projeto Amigos da Leitura que incentivam o prazer pelos livros entre adultos. Eles são alunos de 7ª e 8ª séries do Ensino Fundamental eleitos pelos próprios colegas de escola. Todo mês, visitam as indústrias da região levando uma seleção de livros da biblioteca pública da cidade. No ambiente de trabalho, em horário determinado pela direção da empresa visitada, organizam a exposição dos volumes e cuidam do cadastro de retirada e devolução.

Segundo Edí Fassini, secretária municipal de Educação, os pequenos vereadores indicam obras aos trabalhadores e fazem leituras de poesias e pequenos contos em voz alta para metalúrgicos, costureiras e operários dos setores químico, alimentício e calçadista. Para Ana Paula Machado de Souza, 33 anos, funcionária de uma confecção, a iniciativa deu-lhe a oportunidade de fazer suas próprias escolhas. Até então, ela pedia à filha adolescente que pegasse alguns títulos na biblioteca da escola.

"Olhar o livro e escolher por conta própria faz toda a diferença", diz Ana Paula, que, a cada visita dos vereadores-mirins, garante cerca de três obras para ler durante o mês. E não é somente ela quem gosta das visitas. Ana Paula diz que a experiência surtiu efeito em todos os colegas da confecção. "Quem não lia passou a ler, e o ambiente de trabalho até ficou mais gostoso. Agora, a gente tem mais assunto na hora do cafezinho."

Ler é importante porque...

- Na fase adulta, a leitura de textos mais ricos e de narrativas complexas amplia o vocabulário, desenvolve ainda mais a capacidade de reflexão e interpretação e dinamiza o raciocínio lógico.

- Os livros proporcionam uma "viagem" por mundos desconhecidos, reais ou imaginários, alargando horizontes e elevando os níveis de conhecimento e cultura geral.

Dicas de leitura para adultos

SOLTE OS CACHORROS, Adélia Prado, 128 págs.,Ed. Record.

PRIMEIRAS ESTÓRIAS, João Guimarães Rosa, 236 págs., Ed. Nova Fronteira.

O MÉDICO E O MONSTRO, Robert Louis Stevenson, 104 págs., Ed. FTD.

HISTÓRIAS EXTRAORDINÁRIAS, Edgar Allan Poe, 122 págs., Ed. Larousse do Brasil.

ESTÓRIAS DA CASA VELHA DA PONTE, Cora Coralina, 112 págs., Ed. Global.

JORGE, UM BRASILEIRO, Osvaldo França Jr., 196 págs., Ed. Nova Fronteira.

CARTAS DO CORAÇÃO: UMA ANTOLOGIA DO AMOR, Elizabeth Orsini, 268 págs., Ed. Rocco.

VINTE MIL LÉGUAS SUBMARINAS, Júlio Verne, 232 págs., Ed. FTD.

O MELHOR DAS COMÉDIAS DA VIDA PRIVADA, Luis Fernando Veríssimo, 296 págs., Ed. Objetiva.

AMAR, VERBO INTRANSITIVO, Mário de Andrade, 186 págs., Ed. Agir.

ANTOLOGIA POÉTICA, Carlos Drummond de Andrade, 416 págs., Ed. Record.

POESIAS, Fernando Pessoa, 136 págs., Ed. LP&M.

O PAGADOR DE PROMESSAS, Alfredo Dias Gomes, 176 págs., Ed. Bertrand Brasil.

O QUINZE, Rachel de Queiroz, 160 págs., Ed. José Olympio.

PERDAS E GANHOS, Lya Luft, 128 págs., Ed. Record.

A MORTE E A MORTE DE QUINCAS BERRO D’ÁGUA, Jorge Amado, 120 págs., Ed. Companhia das Letras.




Revista Nova Escola
Elaborado por Bia Costa

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Literatura periférica na sala de aula

O bom currículo de literatura tem mais que só textos canônicos. É importante apresentar linguagens e maneiras de contar histórias diversas




Traços de oralidade misturados a termos da linguagem culta. Incorreções ortográficas, sintáticas ou de pontuação. Selo editorial desconhecido. Textos com pelo menos uma dessas características provavelmente não seriam escolhidos por você para trabalhar literatura com os alunos, certo? E se os autores de produções com alguns ou todos esses pontos, embora desconhecidos, fossem referendados por especialistas como donos de um estilo literário próprio e relevante?

Se você está pensando que elogios e referências desse tipo são capazes de fazer qualquer um mudar de opinião, inclua na sua lista de autores admiráveis Ferrez, Sergio Vaz, Sacolinha, Alan da Rosa, Dinha e Rose da Coperifa. E seja bem-vindo ao universo da literatura marginal, movimento que atualmente reúne autores que têm berço nas periferias brasileiras, escrevem sobre temáticas diversas e se mantêm distantes das normas cultas propositalmente. "Por causa dessas características, não faz sentido avaliar toda e qualquer composição seguindo os critérios pertinentes à criação erudita", explica Heloisa Buarque de Hollanda, coordenadora do projeto Universidade das Quebradas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). São atitudes como essa, inclusive, que fazem a escola estigmatizar o gosto das pessoas e restringir o rol de leitura da moçada. "Não se trata de abandonar o estudo literário canônico, mas garantir espaço para outros", pontua Márcia Abreu no livro Cultura Letrada - Literatura e Leitura. 

A literatura marginal tem como característica a pluralidade, inclusive ao que se refere à gama de definições (leia na ilustração desta reportagem algumas delas). Ela não deve ser, por exemplo, tachada simplesmente de violenta ou de retrato da pobreza e da marginalidade, como costuma ocorrer. Esses temas fazem parte de seu repertório, mas não são os únicos. Cátia Cernov, no recém-lançado Amazônia em Chamas, por exemplo, reúne contos sobre ecologia. Rodrigo Ciríaco, em Te Pego Lá Fora, aborda o cotidiano escolar. Heloisa explica que, no início de carreira, os escritores marginais tendem a falar mais sobre sua realidade, a respeito do "próprio CEP", como eles mesmos definem. Mas muitos abordam outros temas depois.

Para compreender o movimento, é importante saber que ele, na década de 1970, tinha motivações diferentes. De acordo com Heloisa, os autores daquela época, entre outras características, tinham por princípio fazer os próprios livros, o que nem sempre ocorre atualmente. "Era um movimento da contracultura e feito pela classe média", ela define.

Textos marginais, como muitos outros, requerem mediação

Ao promover o estudo de produções marginais, o professor tende a despertar o interesse dos alunos pelo hábito da leitura e amplia o repertório deles de várias maneiras. A razão é o contato com os variados gêneros textuais marcados por temáticas geralmente cotidianas e com linguagem coloquial. Somam-se a isso termos e construções textuais diversificados e às vezes mais palatáveis e autores que não estão no panteão culto, aproximando a relação entre quem escreve e quem lê. Sem contar que esse tipo de proposta é capaz de revelar um caminho para reconhecer textos de qualidade, provocando a turma a eleger motivos para gostar deles ou não e atribuir adjetivos a determinadas produções.

De acordo com o pesquisador inglês Terry Eagleton, a literatura se caracteriza por transmitir emoção estética. E esse é um dos itens que devem permear a análise feita pelos estudantes a fim de que encarem o produto literário como um fenômeno cultural e histórico, que recebe elogios e críticas em diferentes épocas, de variados grupos sociais.

Porém isso tudo não pode abrir as portas da escola para qualquer texto marginal. Tal como em outras adjetivações literárias - infantil e feminina, por exemplo -, existem produções boas e ruins.

Mei Hua Soares, professora de Língua Portuguesa, chama a atenção para outro ponto. "Os alunos, por ainda serem pouco ou nada familiarizados com o universo literário, podem não perceber a função dos objetos de mediação usados pelo autor, como palavrões e distorções da realidade, e acabar rejeitando a obra. Ou, no extremo oposto, ainda ignorando a mediação, se identificar em demasia com ela e passar a fazer apologia descabida ao material", ela explica. Por isso, o papel do educador é tão importante nesse momento quanto diante de um texto de Machado de Assis (1839-1908).

É preciso ajudar os estudantes a comparar produções de naturezas diversas. Não com o intuito de mostrar como uma é inferior à outra, mas para que entendam como e por que diferentes grupos interpretam e registram questões muito semelhantes. E, é claro, para se despir de todos os preconceitos.


Os erros mais comuns

- Propor que a turma corrija os textos em relação à ortografia e à gramática presentes nos textos. Essa estratégia só reforça a ideia equivocada de que os escritores marginais não sabem escrever e encobre o estilo próprio de cada um.

- Oferecer textos marginais que retratem a vida na periferia para estudantes pobres, só porque eles se reconhecerão, ou para os mais abastados, só porque eles não conhecem essa realidade. O objetivo tem de ser apresentar um movimento literário.

Elaborado por Beatriz Vichessi e Cinthia Rodrigues
Site Revista Nova Escola