quinta-feira, 21 de outubro de 2010

O Ensino de Língua Estrangeira: História e Metodologia

Selma Alas Martins Cestaro
(Univ. Fed. Rio Grande do Norte/ USP)

Sejam quais forem as razões - econômicas, diplomáticas, sociais, comerciais ou militares -, a necessidade de entrar em contato com falantes de outro idioma é muito antiga. Supõe-se que as primeiras aprendizagens de uma língua estrangeira aconteceram pelo contato direto com o estrangeiro. Paralelamente a estas aquisições em meio natural, alguns povos se preocuparam em aprender e ensinar, de forma sistemática, algumas línguas estrangeiras.

Segundo Germain (1993), as primeiras provas da existência do ensino de uma segunda língua remontam à conquista gradativa dos sumérios pelos acadianos - do ano 3000, aproximadamente, até por volta do ano 2350. Os acadianos adotaram o sistema de escrita dos sumérios e aprenderam a língua dos povos conquistados. O conhecimento do sumério constituía um instrumento de promoção social, dando acesso à religião e à cultura da época. A aprendizagem do sumério se dava, no entanto, essencialmente através da escrita em língua suméria, o que não correspondia à língua usada pelos alunos em suas práticas cotidianas. Trata-se realmente do primeiro ensino de uma língua estrangeira de que se tem registro.

Como os acadianos, os romanos também procuravam aprender a língua falada pelos povos por eles conquistados. Assim, desde o 3.o século antes da nossa era, os romanos aprendem o grego como segunda língua, sem dúvida por causa do prestígio da civilização grega, já que a administração romana sempre ignorou as línguas bárbaras, tais como o celta, o germânico etc.

Data do 3.· século da nossa era a aparição dos primeiros manuais de aprendizagem de uma língua estrangeira. Tratava-se de manuais bilíngües, enfatizando a prática do vocabulário e da conversação, e eram sobretudo utilizados pelos falantes do latim que aprendiam o grego. Na Gália (França) por volta do século 9, o latim ensinado nas escolas tem o status de uma língua estrangeira - língua culta - em relação à língua francesa - língua popular (Germain, 1993).

O tipo de ensino do latim pouco mudou entre países como Alemanha, Inglaterra e França; nem mesmo se verificou mudança nas condições do ensino do latim durante os séculos VII e VIII. Para ensinar a leitura, os mestres da Idade Média partiam das letras às sílabas, depois das sílabas às palavras e às frases. O estudo da gramática dava-se a partir de textos religiosos. Cantarolava-se um poema para se aprender os casos (nominativo, dativo, etc) e as declinações latinas. Quanto ao vocabulário o aluno deveria aprender de cor o maior número possível de palavras, com a ajuda de glossários, ou seja, de léxicos que apresentavam a tradução em latim das palavras de uso mais freqüente ou tiradas da Bíblia (Riché,1979).

Na Europa, durante a Idade Média, o latim possuia muito prestígio, sendo considerado a língua da igreja, dos negócios, das relações internacionais, das publicações filosóficas, literárias e científicas (Puren, 1988). O século XVI, no entanto, assistiu a uma grande revolução lingüística. Exigia-se dos educadores o bilingüismo: o latim como língua culta e o vernáculo como língua popular (Saviani,1996). Assim, no final da Idade Média e começo da Renascença, as línguas vernáculas - o francês, o italiano, o inglês, o espanhol, o alemão e o holandês - se tornaram cada vez mais importantes e o latim, cada vez menos usado na oralidade. À medida que as diversas línguas nacionais suplantaram o latim como língua de comunicação, elas se tornaram objeto de aprendizagem escolar. No plano metodológico, vale salientar que é o modo de ensino do latim que prevalece durante toda a Idade Média e que o ensino das línguas vivas ou modernas vai se basear no modelo de ensino do latim.

Diante do fracasso deste modelo de ensino de línguas estrangeiras, o tcheco Jan Amos Komensky, Comenius em latim, elaborou seu próprio método de ensino. Em 1638, publica sua obra “Didática magna” onde trata de alguns princípios de didática das línguas; como o princípio da ordem natural, o sensualista e o do prazer em se aprender através de jogos e sem castigos corporais , muito comuns na época. Comenius é considerado por muitos como o fundador da didática das língua enquanto disciplina científica autônoma (Germain,1993). Como já foi tratado anteriormente, o status do latim modifica-se a partir da Renascença. O latim era ensinado na língua dos alunos e as lições eram constituídas de frases isoladas, na língua materna, escolhidas em função do conteúdo gramatical a ser ensinado e memorizado pelos alunos.

A partir do século XVIII, no entanto, os textos em língua estrangeira tornam-se objeto de estudo; os exercícios de versão/ gramática passam a substituir a forma anterior de ensino que partia de frases isoladas tiradas da língua materna. É com base nesse modelo de ensino que o século XVIII assistirá à consagração do chamado “método gramática-tradução” mais comumente chamado “tradicional” ou “clássico”.


Panorama das diversas abordagens do ensino de língua estrangeira

Será apresentada a seguir, uma síntese das principais metodologias que marcaram o ensino - aprendizagem da língua estrangeira, com ênfase na língua francesa. Pretende-se mostrar os princípios que embasam certas metodologias, o papel do professor e do aprendiz e como é feita a avaliação da aprendizagem. Antes de se passar à exposição das abordagens de ensino de língua estrangeira, convém mencionar uma dificuldade terminológica entre método, metodologia e abordagem.

Dentre outras definições Puren (1988) chama de método o próprio material de ensino; metodologia estaria num nível superior, englobando os objetivos gerais, os conteúdos lingüísticos, as teorias de referência, as situações de ensino e subentendem a elaboração de um método. Já o termo abordagem (“approach” do inglês) é definido por Leffa (Leffa apud Bohn e Vandersen,1988) como os pressupostos teóricos acerca da língua e da aprendizagem. Adotaremos, portanto, o termo metodologia ou abordagem para designar a forma como o ensino de língua estrangeira vem se processando ao longo dos anos.


 A metodologia tradicional (MT)

A abordagem tradicional, também chamada de gramática-tradução, historicamente, a primeira e mais antiga metodologia servia para ensinar as línguas clássicas como grego e latim. É a concepção de ensino do latim; língua morta, considerado como disciplina mental, necessária à formação do espírito que vai servir de modelo ao ensino das línguas vivas (Germain, 1993). Os objetivos desta metodologia que vigorou, exclusiva, até o início do século XX, era o de transmitir um conhecimento sobre a língua, permitindo o acesso a textos literários e a um domínio da gramática normativa. Propunha-se a tradução e a versão como base de compreensão da língua em estudo. O dicionário e o livro de gramática eram, portanto, intrumentos úteis de trabalho.

A aprendizagem da língua estrangeira era vista como uma atividade intelectual em que o aprendiz deveria aprender e memorizar as regras e os exemplos, com o propósito de dominar a morfologia e a sintaxe (ibid.). Os alunos recebiam e elaboravam listas exaustivas de vocabulário. As atividades propostas tratavam de exercícios de aplicação das regras de gramática, ditados, tradução e versão. A relação professor/aluno era vertical, ou seja, ele representava a autoridade no grupo/classe, pois detinha o saber. Pouca iniciativa era atribuída ao aluno; a interação professor/aluno era praticamente inexistente. O controle da aprendizagem era, geralmente, rígido e não era permitido errar.

A metodologia direta (MD)

Até aproximadamente a década de 40, o principal objetivo da aprendizagem da língua estrangeira era o ensino do vocabulário. A ênfase era dada à palavra escrita, enquanto que as habilidades de audição e de fala eram praticamente ignoradas (Norris apud Bohn e Vandresen, 1988). Contra esse ensino, tradicional, e respondendo às novas necessidades e aos novos anseios sociais, surgiu a metodologia direta de ensino de línguas (Puren, 1988). O princípio fundamental da MD era o de que a aprendizagem da língua estrangeira deveria se dar em contato direto com a língua em estudo. A língua materna deveria ser excluída da sala de aula. A transmissão dos significados dava-se através de gestos, gravuras, fotos, simulação, enfim, tudo o que pudesse facilitar a compreensão, sem jamais recorrer à tradução. Aliás o termo “direta” se refere ao acesso direto ao sentido sem intervenção da tradução, de forma a fazer com que o aprendiz pensasse diretamente na língua estrangeira. Dava-se ênfase ao oral. Inicialmente, o aluno era exposto aos fatos da língua para, num segundo momento, chegar à sua sistematização.

As atividades propostas aos alunos eram variadas: compreensão do texto e dos exercícios de gramática, transformação a partir de textos de base, substituições, reemprego de formas gramaticais, correção fonética e conversação. Vale ressaltar que os exercícios ditos de conversação eram baseados em pergunta/resposta, perguntas essas fechadas, em que se fazia uma preparação oral dos exercícios que deveriam seguir um modelo, anteriormente proposto. O professor continuava no centro do processo ensino - aprendizagem. Ele era o guia, o “ator principal” e o “diretor de cena”. Não se dava ao aluno nenhuma autonomia, nem se procurava trabalhar em pequenos grupos. Era o professor que servia de modelo lingüístico ao aprendiz. Não havia praticamente nenhuma interação entre os aprendizes; no entanto, eles até podiam conversar entre si, através de jogos de pergunta e resposta.

A elaboração da MD com base numa oposição sistemática à MT não deixou de cometer alguns excessos. É o caso da interdição absoluta da tradução para a língua materna nos primeiros anos de estudo, até mesmo como recurso de explicação, o que acabou por concentrar toda atenção do processo ensino - aprendizagem na figura do professor, visto que era ele quem detinha o conhecimento lingüístico. (Martins-Cestaro,1997).

A metodologia áudio-oral (MAO) ou audiolingual


Com a entrada dos americanos na guerra, o exército sentiu a necessidade de produzir rapidamente, falantes fluentes em várias línguas, faladas nos futuros palcos de operação. A fim de atingir tal objetivo foi lançado em 1943 um grande programa didático que deu origem ao “método do exército” que se desenvolveu no que hoje é conhecido como metodologia áudio-oral. Os princípios básicos desta abordagem eram: a língua é fala e não escrita, (com isso restabelecia-se a ênfase na língua oral) e a língua é um conjunto de hábitos: a língua era vista como um conjunto de hábitos condicionados que se adquiria através de um processo mecânico de estímulo e resposta. As respostas certas dadas pelo aluno deveriam ser imediatamente reforçadas pelo professor. A metodologia áudio-oral era baseada nos princípios da psicologia da aprendizagem: da psicologia behaviorista (de Skinner) e da lingüística distribucional (de Bloomfield), então dominante nos Estados Unidos.

Havia uma grande preocupação para que os alunos não cometessem erros. Para tanto, ensinava-se através da apresentação gradual de estruturas, por meio de exercícios estruturais. Assim, a gramática era apresentada aos alunos, não por regras mas através de uma série de exemplos ou modelos; e os paradigmas gramaticais e o vocabulário eram apresentados não através de listas mas em frases completas. A aquisição de uma língua podia ser considerada como um processo mecânico de formação de hábitos, rotinas e automatismos. O laboratório de línguas passou a constituir um elemento de extrema importância, onde o aluno repetia oralmente as estruturas apresentadas em sala de aula, a fim de serem totalmente memorizadas e automatizadas. O professor continuava no centro do processo do ensino-aprendizagem, dirigindo e controlando o comportamento lingüístico dos alunos.

Após alguns anos de entusiasmo por esse tipo de abordagem, veio a decepção: os exercícios estruturais aborreciam os alunos e, como conseqüência, a motivação decrescia rapidamente; a passagem dos exercícios de reutilização dos modelos dirigidos pelo professor à reutilização espontânea raramente acontecia. Esta seria, justamente, a maior crítica feita à MAO - a incapacidade de levar o aluno a estágios mais avançados devido à dificulade de passar do automatismo à expressão espontânea da língua. Besse e Porquier (1984) criticam o ensino através de exercícios estruturais, afirmando que todo ensino sistemático da gramática através de exercícios do tipo estruturais não é um ensino implícito da língua estrangeira, mas um ensino implícito das regras da descrição da gramática desta língua.

Estudos demonstraram que a longo prazo, no que diz respeito à compreensão oral dos alunos, os resultados não eram significativamente, superiores aos das metodologias anteriores (Puren,1988;Germain,1993).

A metodologia audiovisual (MAV)
Após a Segunda Guerra Mundial, a língua inglesa se torna, cada vez mais, a língua das comunicações internacionais. Estando a situação da língua francesa um tanto ameaçada, algumas medidas foram tomadas a fim de manter a continuação da difusão do francês. Assim, na metade dos anos 50, Petar Guberina, do Instituto de Fonética da Universidade de Zagreb (ex-Iugoslávia), dá as primeiras formulações teóricas do método SGAV (estruturo-global audiovisual). Guberina (apud Germain, 1993) explica seus princípios, afirmando estar a metodologia structuro-global audiovisual, ligada ao conceito da fala em situação de comunicação. A MAV se situa num prolongamento da abordagem direta, à medida que suas principais inovações constituem, em parte, as tentativas de solução dos problemas com os quais se defrontavam os defensores da abordagem direta.

Puren (1988) classifica os cursos audiovisuais em três fases: os de primeira geração, nos anos 60, os de segunda geração, nos anos 70, marcados pela integração didática e por tendência behaviorista e os de terceira, nos anos 80.

A estrita gradação gramatical, bem linear dos cursos audiovisuais de primeira geração, com seus exercícios mecânicos, lembram as frases modelos dos cursos audio-orais. Outra forte influência da MAO diz respeito aos processos combinados de memorização e dramatização dos diálogos de base da MAV e aos exercícios estruturais que são inseridos em muitos cursos audiovisuais.

Os de segunda geração são essencialmente marcados por um esforço de correção e/ou adaptação aos contextos escolares. Podemos citar como exemplo de métodos do francês língua estrangeira classificados por Puren como de segunda geração: La France en Direct (Capelle, Hachette, 1969), C’est le Printemps (J. Montredon, G. Calibris, C. Cesco et al. CLE International, 1975), dentre outros.

Já os chamados de terceira geração nos anos 80 são caracterizados por tentativas de integração de novas tendências didáticas, “nocionais-funcionais” e “comunicativas”. São exemplos desta geração, os métodos do francês língua estrangeira: Archipel (J. Courtillon et S. Raillard, Didier, 1982), Sans Frontière (M. et M. Verdelhan, P. Dominique, CLE International, 1982), dentre outros.

Nas duas primeiras fases da MAV, o aluno desempenha um papel receptivo e um tanto submisso diante do professor e do manual. Ele não tem autonomia, nem criatividade. O professor centraliza a comunicação, é manipulador e técnico.

Com o método de ensino do francês língua estrangeira Archipel, classificado por Puren como de terceira geração dos métodos audiovisuais, toda idéia de progressão é abolida. Outra mudança proposta por Archipel é o abandono do excesso de imagens (uma série de imagens correspondendo a uma série de réplicas) como suporte de construção do sentido dos diálogos. Excesso que era cometido nas duas primeiras fases da MAV. Em Archipel, as imagens constituem o ponto de partida da explicação, não o suporte principal da comunicação. A imagem desempenha o papel de estimuladora verbal e “provocadora” (Galisson, 1980) e não mais de facilitadora semântica, como ocorria nas metodologias anteriores.

Os cursos audiovisuais de terceira geração procuraram integrar a pragmática utilizando as noções de atos de fala como modo de classificação das formas lingüísticas, no que diz respeito à gradação, à apresentação e ao reemprego. A noção de atos de fala (Searle e Austin), correspondem à ação desempenhada pela fala e o seu funcionamento pragmático: exprimir um desejo, desculpar-se, pedir permissão, etc.

A noção de atos de fala foi muito utilizada com o objetivo de fazer a descrição de um “niveau-seuil” de competência lingüística, concebido como um instrumento de trabalho colocado à disposição dos responsáveis de programas de ensino de línguas, de autores de métodos e de professores de francês (Coste, 1978). Esse “niveauseuil”, nível de base ou limiar, corresponde a aproximadamente 150 horas de aulas, isso em condições habituais de ensino escolar, e é concebido como uma série de conhecimento e aptidões que o aluno deve aprender para poder se manifestar de maneira simples, mais eficaz num país estrangeiro (Coste et al., 1976). As duas primeiras fases da MAV receberam críticas por privilegiar a função denotativa ou referencial da linguagem em detrimento das funções: fática (que visa estabelecer e manter o contato entre os interlocutores), da emotiva (que permite ao locutor exprimir sua subjetividade) e da conativa (que visa agir no destinatário da mensagem de forma a suscitar-lhe uma ação ou reação ).

Na MAV, classificada de terceira geração, a relação professor-aluno é mais interativa que nas duas fases anteriores. O professor evita corrigir os erros dos alunos durante a primeira repetição. Em seguida, começa o trabalho de correção fonética até a fase de memorização. O professor corrige discretamente a entonação, o ritmo, o sotaque etc. (Germain, 1993). O objetivo das avaliações é medir o domínio da competência lingüística e de comunicação, assim como a criatividade. Os princípios da metodologia audiovisual de terceira geração coincidem, em parte, com os da abordagem comunicativa, inclusive alguns autores incluem os manuais classificados por Puren (1988) de audiovisuais de terceira geração, como métodos comunicativos.

Metodologia comunicativa (MC)

Enquanto nos Estados Unidos ainda se dava ênfase ao código da língua, ao nível da frase (Bloomfield, lingüística estruturalista, e Chomsky, gramática gerativo- transformacional), na Europa os lingüistas enfatizavam o estudo do discurso. Esse estudo propunha não apenas a análise do texto oral e escrito, como também as circunstâncias em que o texto era produzido e interpretado. A língua é, então, analisada como um conjunto de eventos comunicativos (Leffa apud Bohn e Vandersen,1988).

A abordagem comunicativa centraliza o ensino da língua estrangeira na comunicação. Trata-se de ensinar o aluno a se comunicar em língua estrangeira e adquirir uma competência de comunicação. Este conceito foi desenvolvido por Hymes (1991) baseado em reflexões críticas sobre a noção de competência e performance de Chomsky. Hymes, cujo objeto de trabalho é a etnografia da comunicação, afirma que os membros de uma comunidade lingüística possuem uma competência de dois tipos: um saber lingüístico e um saber sociolingüístico, ou seja, um conhecimento conjugado de formas de gramática e de normas de uso. No caso da língua materna, a aquisição destes dois sistemas de regras acontece conjuntamente e de forma implícita. A partir dos trabalhos de Hymes, a noção de competência de comunicação foi rapidamente utilizada em didática.

Saber comunicar significa ser capaz de produzir enunciados lingüísticos de acordo com a intenção de comunicação (pedir permissão, por exemplo) e conforme a situação de comunicação (status, escala social do interlocutor etc.). O essencial de uma competência de comunicação reside, portanto, nas relações entre estes diversos planos ou diversos componentes.

Canale e Swain apud Germain (1993) afirmam que uma competência de comunicação compreende uma competência gramatical, uma competência sociolingüística e uma competência estratégica. Para Sophie Moirand (1982) a competência comunicativa pressupõe a combinação de vários componentes: lingüístico, discursivo, referencial e sócio-cultural.

A gramática de base da MC é a nocional, gramática das noções, das idéias e da organização do sentido. As atividades gramaticais estão a serviço da comunicação. Os exercícios formais e repetitivos deram lugar, na metodologia comunicativa, aos exercícios de comunicação real ou simulada, mais interativos. Utiliza-se a prática de conceituação, levando o aluno a descobrir, por si só, as regras de funcionamento da língua, através da reflexão e elaboração de hipóteses, o que exige uma maior participação do aprendiz no processo de aprendizagem.

A abordagem comunicativa dá muita importância à produção dos alunos no sentido em que ela tenta favorecer estas produções, dando ao aluno a ocasião múltipla e variada de produzir na língua estrangeira, ajudando-o a vencer seus bloqueios, não o corrigindo sistematicamente. A aprendizagem é centrada no aluno, não só em termos de conteúdo como também de técnicas usadas em sala de aula (Martins-Cestaro,1997).

As estratégias utilizadas visando à produção de enunciados comunicativos são variadas: o trabalho em grupo que permite a comunicação entre os alunos (com a preocupação maior nas estratégias de comunicação do que na forma dos enunciados); as técnicas de criatividade e as dramatizações (jeux de rôle) que permitem a expressão mais livre, a leitura silenciosa, global de textos autênticos (em oposição a textos fabricados para fins pedagógicos), o papel fundamental da afetividade nas interações como também o trabalho individual autogerado, como meio de desenvolver sua capacidade de auto-aprendizagem (Moirand, 1982, Galisson, 1980). O erro é visto como um processo natural da aprendizagem; através do qual, o aprendiz mostra que ele testa continuamente as hipóteses que levanta sobre a língua (Germain,1993). O professor deixa de ocupar o papel principal no processo ensino-aprendizagem, de detentor do conhecimento, para assumir o papel de orientador, “facilitador”, “organizador” das atividades de classe. Um outro fator relevante e facilitador da aprendizagem é a atmosfera que reina na classe, e esta depende, em grande parte, do professor. Ele precisa ser caloroso, sensível, tolerante, paciente e flexível a fim de que possa inspirar confiança e respeito (Robinett apud Bogaards, 1991). Estes fatores contribuiriam para baixar o filtro afetivo, como diz Krashen (1982), favorecendo, portanto, a aprendizagem.

As abordagens funcionais ou comunicativas, no entanto, são criticadas por serem ricas em discurso teórico e pobres em tecnologia, procedimentos e exercícios, ao contrário das metodologias mecanicistas (MAO e MAV) de serem ricas em tecnologia (gravador, projetor, laboratório de línguas...), em procedimentos e em exercícios (exercícios estruturais, micro- conversação...) e pobres em discurso teóricos (Galisson, 1982).

Nesta retrospectiva vale mencionar a metodologia do francês instrumental ou funcional, que não foi aqui tratada por se entender que tanto os objetivos de ensino como a organização das aulas de francês instrumental não se ajustam aos objetivos propostos neste estudo. Enquanto as metodologias tratadas neste trabalho, procuram dar conta das quatro habilidades, ou seja, compreensão e expressão oral e escrita, o francês intrumental privilegia, preferencialmente, a compreensão de leitura.
Ao se analisar as metodologias de ensino aqui citadas, verifica-se que todas privilegiam o estudo da língua. Ora vista como um conjunto de palavras de vocabulário, ora de estruturas gramaticais, de noções ou funções. Algumas metodologias, além do estudo da língua, levam em conta a psicologia da aprendizagem: o processo e/ou as condições de aprendizagem. O professor representa a autoridade e o modelo a ser seguido, exceção feita à metodologia comunicativa em que o professor tem múltiplos papéis, mas não é visto como autoridade. No que diz respeito ao aluno, verifica-se que nas metodologias analisadas ele passa de um papel passivo a um mais ativo, com tendência a desenvolver uma independência e uma certa autonomia face à aprendizagem.

Diversos elementos se conjugam a fim de dar conta da aprendizagem de uma língua estrangeira, mas considera-se que o “estar motivado para aprender”, constitua a melhor forma de aprendizado, independente da metodologia a ser utilizada. Acredita-se que para manter a motivação pela língua estrangeira em estudo, o aluno precisa se engajar no processo, tem de “aprender a aprender” e ser capaz de assumir uma parte de responsabilidade por sua aprendizagem.

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